[Apartamento] Kylie Winterfell

por **Kylie Winterfell** Sex maio 16, 2014 11:13 am

“Como eu deveria começar minha história? Talvez como David Copperfield? Eu nasci, vivi ...”

Por um instante me perco em pensamentos. O som do teclado do meu laptop sessa enquanto tomo mais um gole de café. Seguro a caneca do Starbucks com as duas mãos o calor aquece minhas mãos e causa ondas de arrepio em meu corpo. Observo a fumaça que surge do interior da caneca se desprendendo em direção ao nada, tão leve quanto o próprio ar. O aroma do café lembra o campo. Experimento mais um gole. Seu sabor é intenso. Corro meu dedo indicador pela inscrição gravada no corpo da caneca. "Starbucks Brazil". Um presente de um amigo querido que há anos não vejo. De repente vejo o rosto de Alex surgindo em meus pensamentos com seu sorriso largo e olhos cheios de energia. Os pensamentos se dissipam assim como a fumaça que se desprende fundindo-se com a escuridão. O relevo das letras fazem cócegas.

A luz azulada da tela do computador é a única luz que ilumina o quarto. As letras em sua tela vão retrocedendo até que o documento na tela esteja em branco outra vez. Não sou como David Copperfield e tão pouco minha vida foi um conto de fadas. Procuro em meu interior a minha essência, a minha alma, mas o que encontro é apenas o vazio. A única palavra que vem a minha mente é a palavra tragédia. E como se o céu houvesse se rasgado sou tragada para dentro de um turbilhão de sentimentos, procurando desesperadamente juntar os cacos do meu coração. É como se eu houvesse sido esquartejada e tivesse as partes do meu corpo espalhadas, vivendo em um eterno inferno, sem conseguir conter o sangue que escorre de mim, sem conseguir conter a dor. Meus olhos se enchem de lágrimas e pisco meus olhos rapidamente como se isso fosse capaz de impedi-las . Desligo o computador e então a escuridão me abraça, me conforta.

Tragédia. A comédia da vida, a arte em sua forma obscura, o amor, a dor, a alegria. A arte que imita a vida, que imita arte, que nos imita e nos faz querer vomitar. Tragédia. Romeu e Julieta, Hamlet, A Divina Comédia. Minha vida sempre foi uma tragédia. Dos palcos à vida real, um musical, um desespero. Ceder à loucura ou padecer em sanidade?

Como não pensar em tragédia quando uma vida é tirada para que outra possa existir? Por mais que tente me fazer entender a dor e a culpa estão além da minha compreensão. Rejeição. Uma criança apenas querendo ser amada, inocente, frágil, querendo se sentir segura. Você matou sua mãe! Você é um monstro consumidor de vida e ou odeio você! Eu amo tanto você papai, não vai embora.

Rejeição. Uma mulher apenas tentando expressar sua dor através da arte, amor, ser ou não ser eis a questão. Você não é boa o suficiente, você não tem talento. Broadway, portas fechadas. Rejeição. Inferno de Dante e eis que me torno minha própria divina comédia.

Levanto-me do chão do quarto tentando entender como vim parar aqui. Me arrasto até o banheiro e no espelho vejo uma figura desgrenhada. Meus cabelos estão embaraçados e os meus olhos parecem fundos. As olheiras marcam meu rosto tornando ainda mais sombria a mulher refletida no espelho. Despida de maquiagem o azul dos meus olhos se contrastam com o vermelho. Não havia dado conta de chorara tanto. Tiro de dentro do armário um antidepressivo. O médico não mentiu quando disse que o efeito era rápido e que eu dormiria como uma pedra. Nos meus sonhos ainda estou no palco, ainda sou aquela atriz glamorosa a quem a mídia adora criticar. Ainda sou aquela mulher que adora sorrir para os paparazzi enquanto queimo de ódio por dentro. Nos meus sonhos ainda sou Kylie Winterfell a glamorosa dama de gelo da Broadway.

Continua em https://vampiro.forumeiro.com/t62p80-o-cordeiro-massacrado